F: Com tudo que temos observado
juntos, chego no seguinte ponto: é falso todo o conteúdo do fluxo mecânico e
não solicitado do imaginal-sensorial condicionado. Não há nenhum caminho,
nenhum sistema, nenhuma programação, nenhuma prática, nenhum esforço pessoal que
funcione para limpar isso, para fazer com que tal fluxo se detenha. Você pode
fazer o que quiser, como já o tem feito até aqui, mas, no fim do esforço, se
você for sério, verá que ele continua lá, portanto, qualquer ação da estrutura
para superar a estrutura, trata-se de um investimento no falso.
O: Percebo o mesmo aqui.
F: Não tem como negar que o conteúdo
é falso, ela está ali, mas continua falso... O indivíduo pode negar o imaginal
e seus absurdos, o quanto quiser. Já tentamos nos ajustar a princípios
religiosos e espiritualistas para tentar trocar defeitos por virtudes, para poder melhorar o caráter, crescer espiritualmente — seja lá o que isso queira dizer. Já
tentamos de tudo que chegou ao nosso alcance e, depois de muito esforço,
percebemos que nunca saímos do lugar... Sempre ficamos na dança de trocar
seis por meia dúzia... Tudo se mostrou ilusório!... Você sabe, já tentamos a
crença, já imaginamos um Deus e para ele rezamos e rogamos, tentamos manter um
contato consciente com esse Deus, o qual era um produto da confusão do nosso
imaginal, para tentar acabar com a confusão do imaginal... Tudo falso! Tudo
ilusão! Vimos tudo isso, por mais que desejássemos, não funcionou.
O: Não ficou a menor sombra de
dúvida quanto a falsidade de tudo que tentamos até aqui.
F: Você pode analisar o conteúdo o
quanto quiser, mas ele ainda é falso. Já estou com você nessa observação há
quase dois anos... No entanto, por mais clareza que conseguimos com o processo
de observação passiva não reativa, ela também não se mostrou capaz para deter o
conteúdo, que em si mesmo, é falso.
O: Sim, muitos confrades bem
intencionados tentaram a observação passiva não reativa, mas, até aqui, nenhum
deles consegui transcender sua inquietude original, a maioria até abriu mão do
conteúdo do paradigma, e se entregou a algum tipo de filosofia. Por isso que
afirmo que ninguém se vê livre do falso, sem que, num momento inesperado, seja
invadido por um derrame da verdade, por um derrame de lucidez.
F: Calma! A percepção que o conteúdo
é falso, me parece ser o mais elevado estado da observação, de que todo
imaginal é falso. Isso é o mais elevado estado da observação até aqui.
O: Olhando na história, ninguém foi além da simulação
de sentir e do cálculo autocentrado, sem um derrame da verdadeira capacidade de
sentir e de perceber a realidade.
F: Quero dizer outra coisa, sem
entrar aí... Estamos vendo que não sentimos cálidos e significativos
sentimentos, que não temos real afetação por nada... Esse é o ponto, já não há mais
negação ou simulação quanto a isso, essa é a verdade; chegamos nisso, por mais dolorosa que seja essa percepção!
O: O estado já foi além da
observação do falso... se encontra na possibilidade de não reagir de forma
alguma a esse falso percebido, pois qualquer reação, aqui é igualmente vista como
falso.
F: Também entendo isso,
claramente e sem esforço. Mas veja que chegamos nesse estado de não ter nem
palavras para descrever o que está acontecendo...
O: Vimos que reagir, seja de que
modo for, enquanto na mente com base no medo, é lançar mais gasolina para o falso.
F: Sim! Mas ainda não é isso...
Veja, o indivíduo pode lutar para não reagir — o que é diferente de não reagir —
porque a não reação também está acontecendo sem qualquer esforço de nossa parte;
nem sempre mas com maior frequência.
O: Quando há esforço para não
reagir, é ainda um investimento no funcionamento do falso, trata-se da própria
estrutura em ação, por meio de seus condicionamentos.
F: Foi a percepção do falso — que
é o conteúdo do imaginal — que nos trouxe até este momento, o qual afirmo ser
um momento distinto de tudo que já vivi. Todo condicionamento de ter que
ser isso, de ter que ser aquilo, de ter que fazer isso ou aquilo para chegar
naquilo que é imaginado como solução, etc., etc., etc., tudo isso está morrendo
de modo natural.
O: A mente quando se depara com
isso, reage, lançando a ideia de que, por você não estar fazendo nada, está caindo num
estado que só pode ser loucura.
F: Sim, o imaginal diz que a loucura
está aqui, batendo na porta... O imaginal grita que pirei de vez...
O: Isso é muito natural, visto
que a mente foi condicionada para lutar, para batalhar, para disputar, para
reagir... A totalidade de sua educação — que não tem nada de educação, mas sim,
de condicionamento — está sustentada na ideia do tipo: "comerás o pão com
o suor do teu rosto"...
F: Isso é também um fato constatado,
aqui e agora. No entanto, vamos com calma...
O: A educação glorifica e
presenteia a lógica e a razão... Mas com uma observação mais apurada, não é
difícil de você perceber que a própria lógica e razão, são igualmente falsas.
F: Sim, a própria lógica e a razão
são falsas. Mas, quero ficar nesse ponto da percepção de que todo conteúdo do
imaginal é falso, assim como na clareza que a percepção disso traz. Porque veja,
tentamos a vida toda mudar isso, entender isso, ou fugir disso... Principalmente,
antes de se instalar a observação passiva e não reativa, o fato que não sentirmos
real afetação, real comunhão, era visto com muita culpa, muita dor, autopiedade,
etc., etc., etc. Percebo agora que, com o amadurecimento da observação, começamos
a ver a queda do mundo dos conceitos que criam a culpa, a dor, a autopiedade e
tudo mais... Vemos a banalidade disso tudo.
O: Não vamos dizer que a lógica e
a razão são falsas, mas que são limitadas, não alcançam a percepção da
realidade do que é. O que você vê como lógico agora, daqui cinco minutos, pode
ver como falso. Tome isto como exemplo: num determinado momento da sua
experiência, você vê como lógico votar no candidato "X" e, depois de
alguns meses, "quando X" se revela, você percebe que não foi nada lógico
acreditar em "X", portanto, que agora se mostra lógico apoiar seu processo
de impeachment.
F: Sim, vemos que por meio da lógica e da razão, nunca alcançamos a percepção plena da realidade. Vendo tudo isso, chegamos
realmente, no fim do esforço, chegamos na limitação da lógica e da razão. Vemos
tudo isso como fato, sem espaço para mimimi, sem chororô e sem recorrer ao
imaginal.
O: Exato.
F: Até nossos sentimentos estão
falsificados, porque são rotulados pelo falsificado imaginal. Tudo isso está
claro demais, nunca tive uma percepção tão aguçada. Por isso chegamos no ponto em
que as palavras não alcançam... Chegamos no mundo do Morpheus... Tudo sensações
rotuladas pelo imaginal.
O: Sim.
F: Ontem você me perguntou: Você
viu Deus? Viu o espírito? Viu a alma?... Nem deus, nem muita coisa... recebemos um baita condicionamento, uma
violenta carga conceitual. Percebo que chega num nível que tudo é o que é, e
ponto final. Nossa, isso arrebenta a cabeça! Estamos olhando a coisa como é, observando
o tempo todo, e isso é tudo! Só nos cabe a observação, mais nada! Por sorte que
isso rolou. O que tem que ou que não tem que, tudo isso agora é visto como
papagaiada, tudo incertas doações psíquicas de terceiros, tudo formas de
condicionamento, tudo falácia. E só nos agarramos a isso por tanto tempo, por
que era muito grande nosso estado de confusão. Nossa insanidade, nossa ausência
de autonomia psicológica, não deixava perceber a falácia disso tudo: ter que
ser bom filho, bom funcionário, bom pai, bom patriota... Não saber o que é isso
mas simular ser isso... Ter que ser isso, ter que ser aquilo, ter que ter boa
vontade, ter que amar pai e mãe, ter que amar Deus sobre todas as coisas, ter
que reparar, ter que ter sucesso, poder e prestígio... Nossa! Que leveza
perceber e largar todo tipo de “tem que”! Nossa, mano!
O: Uma enorme rede de inquestionados
condicionamentos.
F: Chegamos no ponto de ver o quão
hipócrita é a totalidade do conteúdo do imaginal sensorial condicionado... A
totalidade... Com a observação passiva não reativa, de fato, não fica pedra
sobre pedra.
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