O: Quando você se liberta das
antigas drogas anestesiantes, a inquietude da falta do que fazer já começa logo
cedo. Antes dava para se narcotizar com o exibicionismo ou com o voyeurismo
espiritual.
F: Começa? Muito loca essa
inquietude primal.
O: Você estava pensando no que
fazer quando dormia?
F: Ainda bem que não. E o mais
interessante, por mais que pensamos no que fazer, não adianta, pois nada acaba
com a inquietude.
O: Antes fazia sentido ficar
postando vários textos de mestres, acompanhadas de figuras ou diagramações coloridas,
vários áudios, várias frases, as quais nada mais eram do que “firulas
espirituais”, mas agora, nada disso faz sentido, uma vez que você percebe que
nada disso foi capaz de lhe brindar com uma nova e incondicionada qualidade
psicológica.
F: Nada mais resolve, isso é um
fato.
O: Montar grupos nas redes
sociais para ajudar os demais a entender Krishnamurti, ou para alcançar o Despertar
Integral, ou ficar com frases do tipo, “o sentido da vida é viver”, "todos
somos um", ou "o mundo é uma criação da mente", todo esse tipo
de firula, de modo algum desmonta aquela vidinha de fachada, hermeticamente
fechada.
F: Besteirol.
De fato, como bem nos mostra a
realidade, somos todos um, somente no que diz respeito ao mesmo modo de vida
condicionada, autocentrada, calculista, melindrosa, rancorosa, vingativa e
lasciva.
F: Sim.
O: Na verdade, nada sabemos de
real comunhão com qualquer manifestação de vida.
F: Os pensamentos ficam nisso, cortando
qualquer forma de relação sem cálculo.
O: Tudo é muito "bunitim",
mas, quando você sai do aplicativo, não tem como aplicar naquele que se
deparara com seu espelho.... A inquietude está lá, pedindo por uma nova
postagem, uma nova frase, um novo link, um novo comentário pra disputar quem
tem melhor entendimento da verdade, pedindo para conhecer outro mestre, outro
site, outro grupo, onde talvez possa encontrar a resposta final para sua
inquietude crônica, pra sua ausência de sentido real. Mas nada, nada, nada,
nada disso descontrói essa débil estrutura psíquica construída ao longo de anos
de ansiedade, insegurança e senso de não pertencer.
F: Fato.
O: Nadinha disso faz com que
você, finalmente, encontre o sentimento de "estar em casa novamente".
Tudo isso só serve para alimentar uma nova imagem de si mesmo, mais nada! Tudo isso
alimenta sua imagem, mas, de modo algum, revela e o livra de seu estado psicológico
negativo. É como a droga: leva muitos anos para cair essa ficha e sair fora
desse embuste de compartilhar firulas espirituais.
F: Sorte nossa ter conseguido uma
maturidade para ver todo esse mecanismo e ficar com ele, porque, numa
observação mais apurada, você perceber que não tem o que fazer.
O: Você pode levar uma vida toda
alimentando falas mansas, enfeitadas com remendos poéticos de terceiros, mas o
que você pode conseguir com isso?... Somente enganar um pequeno grupo de homens
e mulheres desavisados, egocêntricos e mal amados.
F: Tudo balela!
O: Quando você volta para o seu
quarto, o vazio está lá, a inquietude está lá, aguardando pelo tipo de droga
que você, anonimamente, se utiliza para tentar aplacá-los. A pose do palanque
físico ou virtual, não tem o poder de esconder a real. E qual é a real? O
vazio, a ansiedade e o impulso para a busca de uma sensação diferente da
inquieta realidade interna. Faça sol ou faça chuva, sozinho ou bem acompanhado,
eles estão lá... bem no fundo, por trás da máscara espiritual do indivíduo.
F: Estão lá! Esse é o fato!
Ficamos tão atentos que até o que comemos, percebemos que é açúcar, sal, etc.,
etc., etc. E que essa sensação está, momentaneamente, fazendo a cabeça. A
observação passiva não reativa ligou o alerta para isso.
O: Você pode até escolher um novo
nome com um sentido da espiritualidade indiana ou oriental, mas, de modo algum,
isso muda a inquieta realidade psíquica que só você e seu travesseiro conhecem.
F: Falso demais!
O: Tudo isso são camadas sutis da
mesma estrutura imatura que simula maturidade.
F: Não existe isso, a única opção
é observar e sentir a inquietude, a ansiedade, os impulsos para buscar por uma
nova sensação.
O: Tudo isso pode enganar
momentaneamente, outras mentes muito mais imaturas, em profundo estado de
confusão, mas não uma mente que despertou para a percepção do falso em si
mesma.
F: Depois que ocorre o choque de
separação que permite ver o imaginal... pronto! Não tem mais como enganar a si
mesmo com qualquer tipo de pose ou prática espiritual.
O: Essa imaturidade da mente
condicionada, aplica um truque no indivíduo... Ela o retira da disputa
financeira e o lança na disputa do conhecimento da verdade... E do mesmo modo
que ele permaneceu por anos na disputa financeira, na disputa espiritual,
seguem-se longos anos de ilusão.
F: Essa é a disputa que roda o
mundo. Mas tudo que é pensado, imaginado, é imaginação, é irreal...
O: Antes o indivíduo queria
controlar a empresa, o mercado financeiro, agora ele quer controlar o grupo
espiritualista, o modo como o satsang deve transcorrer, bem como sua rede de
confusos e inseguros seguidores. O indivíduo sai de um tipo de exploração e se
dedica a outro ainda mais sutil. Mas, quando o indivíduo alcança a mais
avançada etapa do processo de descondicionamento, tudo isso acaba no platô da
indiferença. Enquanto o indivíduo não se apercebe desse truque da mente calculista,
não tem a menor chance de saber se é possível ou não, um renascimento psíquico.
F: Sim, ele chega no Platô da
Indiferença.
Nenhum comentário:
Postar um comentário