16/02/2021

A maturidade do Platô da Indiferença

 

O: Bom dia, Confrade! Esse platô da indiferença é o estado mais maduro que já vivi, apesar dele ainda estar inserido na inquietude. Ele mostra claramente que essa inquietude — que sempre foi a base da nossa estrutura psíquica traumática, adulterada —, foi ela que nunca nos deixou, participar com a totalidade de nosso ser, de nada que se apresentava diante de nós. Essa inquietude é que sempre nos impediu o conhecimento de uma real conexão, que sempre nos manteve na superficialidade relacional.

F: Percebo o mesmo aqui!

O: Foi ela que sempre nos impediu a entrega total de nós mesmos.

F: Hoje há uma frieza — não sei se essa é a melhor palavra —, que não é por maldade, como já foi anteriormente. Trata-se de uma frieza de maturidade, sem emocionalismo barato.

O: Se possível, é claro, tente aprofundar melhor isso. Veja que anteriormente, nunca houve essa capacidade de indiferença, visto que nos embolávamos com tudo que se passava no imaginal e no sensorial, fazendo com que saíssemos reagindo de forma neurótica.

F: A indiferença de hoje é de outra qualidade. Anteriormente, a indiferença era sentida, calculada, maldosa, separatista, vou colocar assim.

O: O platô de indiferença a que me refiro, é ao que se passa internamente.

F: Exato. Antigamente, sempre algo era adicionado ou repelido por esforço.

O: Hoje somos indiferentes, não ao ambiente externo, mas ao que sentimos em relação ao ambiente externo. Agora estamos vendo o mecanismo da inquietude e sua compulsão por sensação.

F: Sim, nunca foi o externo! Pensávamos que era.

O: E estamos ficando indiferentes, tanto à inquietude quanto à busca de sensação. Ocorre isso aí?

F: É a busca de sensação que mantém a sútil identificação com a totalidade da estrutura.

O: Agora fica claro, que nosso estado incondicionado de ser, é que sempre esteve causando essa inquietude, para poder romper com a capa de condicionamentos, só que não entendíamos isso, e colocávamos outro condicionamento, outra sensação, as quais foram fortificando a estrutura. A inquietude parece ser o próprio estado incondicionado, querendo romper de vez com a limitação da estrutura condicionada.

F: Exato! Ela nem é o problema, se tomarmos a inquietude como sendo algo que está arrebentando tudo.

O: O próprio incondicionado está rompendo a crosta de condicionamentos; é ele que está mostrando tudo.

F: Ele próprio socando a casca de condicionamentos.

O: Tudo por meio da observação passiva não reativa.

F: Tinha que ser interno.

O: Como o pintinho querendo sair do ovo.

F: A inquietude é o pão nosso de cada dia.

O: A inquietude parece ser um resultado da ação do estado incondicionado, querendo romper a estrutura adulterada. A fuga da inquietude é que sempre nos impediu até aqui, de saber o que é amor, liberdade e felicidade, fazendo com que só conhecêssemos compulsão por prazer, por sensação e, como resultado, insatisfação, frustração e limitação. A busca da fuga da inquietude é que criou todos os nossos padrões de dependência e codependência.

F: Concordo que possa ser isso.

O: É a nossa natureza exata querendo romper com o que não é exato, com o que não é natural, com o que não é espontâneo; é o estado em que somos psicologicamente autossuficientes, querendo romper com nossas dependências e limitações de expressão de ser; nosso estado lúcido querendo romper com nossa ausência de lucidez. Parece que sempre foi isso, mas nos faltava a capacidade de visão quanto aos movimentos de fuga que sustentavam a ausência de liberdade, lucidez e naturalidade de ser; éramos controlados pelos impulsos emotivos reativos escapistas, os quais nos impediam de ficar com a inquietude, qual vai dinamitando as crostas de condicionamentos e dependências. Podemos dizer que agora, estamos inseridos na maior síndrome de abstinência, que é a de se abster dos mais sutis mecanismos de fuga por meio da busca de uma sensação diferente da inquietude.

F: Sim.

O: Foi sempre a inquietude não reconhecida que sempre nos mantinha num estado de ansiedade, onde sempre estávamos querendo fugir das situações, nunca inteiros na situação, onde só o corpo estava presente, mas a mente ausente... Não havia presença integral.

F: Sim, sempre foi a identificação inconsciente com a inquietude e com os impulsos emotivos reativos que dela explodiam. Tudo isso é muito sútil... Porque na realidade, como podemos ver, trata-se da ilusória identificação com o próprio corpo, com o próprio fluxo mecânico e não solicitado.

O: Sim, mas agora, há um distanciamento, uma centrante indiferença.

Nenhum comentário:

Postar um comentário