08/01/2022

Eu por mim mesmo, só fortaleço o mim mesmo inquieto

 

F: Bom dia, Out! Percebo que, em sua angústia, cada um inventa sua própria oração…

O: Já vimos que a prática da oração é só mais um dos condicionamentos ilusórios; ela não tem o poder de nos tirar da bolha emocional que nos mantêm desconectados; e não há nada que nos conecte, cada um na sua bolha de imaturidade, ilusão e cálculos autocentrados. Visto isso, o que permanece é só angústia e ansiedade; quando elas não estão aí, fica o tédio ou solidão.

F: Ou vazio. Nada. Quando o imaginal da trégua, cai o castelo.

O: Mas logo começa outro; percebo como ponto básico a desconexão.

F: Se o imaginal ficar entrando, não tem com sentir, ver, tocar ou ser tocado.

O: E quando o imaginal não está aí? O imaginal é a própria bolha; está sempre aí, mesmo que de modo sutil. O imaginal é o fundo da estrutura isolante; nada rompe sua casca, a inquietude não permite. A própria preocupação para acabar com a inquietude não permite a conexão, visto que a inquietude impede a totalidade da presença.

F: A própria observação nos mantém atentos na ilusão. Dificílimo uma observação sem emendar palavras na sequência. Muito difícil ficar na observação e não esticar o chiclete.

O: A inquietude faz isso.

F: A mente incessante busca por algo na inquietude.

O: Sim, mesmo que sejam as palavras, a verbalização compulsiva, que não leva a nada mais que a compreensão da estrutura, mas sem o poder de transcendência.

F: A palavra parece funcionar como um combustível. O lance da desconexão é não se tornar combustível do imaginal; o pensamento continua, só que sem punhetagem da nossa parte.

O: Isso também não resolve.

F: mas é o que temos; percebemos a desconexão de forma natural, pois ela está em todos. Não adianta mais ficar alimentando o imaginal.

O: Aqui o imaginal não incomoda mais... folha ao vento. O que pega é a inquietude, o desassossego. Quando observo as relações, percebo que o que tem de fato é a desconexão e a simulação de conexão; todos em seus personagens... se o contato for longo, o personagem se cansa e o atrito da desconexão se apresenta.

F: Mas quanto mais o imaginal pega essa desconexão, mais a cristaliza e fica nisso.

O: Faz você sentir a desconexão com maior intensidade.

F: Isso, não deixa cair. Quando é mais uma ilusão, porque vivemos o outro lado da coisa e não tem nada disso. Estranho. Se não ficar atento, o imaginal não deixa passar, mas sem ficar identificado, querendo manter ou prender as coisas, entender, tudo isso.

O: Mas também não resolve; essa é só a "droga" atual que estamos usando. Permanece o desassossego, a inquietude, a desconexão.

F: Não tem o que resolve, só tem isso. O looping nos joga sempre no desassossego, a inquietude, a desconexão... O imaginal pega a desconexão, traz a angústia, ou o imaginal pega percebe outra coisa e nela se apega... Mas é o mesmo movimento que acaba sempre no desassossego, na inquietude, na desconexão. De novo, de novo e de novo. O sensorial também muda.

O: Mas a mudança do sensorial é só na manifestação do desassossego.

F: Então, aqui, novamente, a mente pega e fica aí, se prende nisso que observa; a própria observação prende e não solta. A coisa é louca, quando, na realidade, do nada também some. Chega uma hora em que não adianta mais nada. A mudança do que se passa no sensorial não depende de nada; é a mente que segura, tentando entender, compreender, sair ou mesmo ficar; mas nada resolve.

F: Também parte do constante, ininterrupto e não solicitado fluxo... Sempre a mesma coisa: pensamentos, sensações diversas, sentimentos... Tudo mesmo fluxo não solicitado. A própria percepção também está nisso, ela é parte disso.

O: A ignorância parecer ser uma benção mesmo; quanto mais consciência você alcança sobre a estrutura e sua inquietante desconexão, mais inquietude e sentimento de desconexão. Se instala um estado de emergência.

F: E quanto mais conscientes ficamos, menos relaxados; a consciência disso só gera tensão e a percepção de que não adianta mais nada. E nisso tudo, de nada adianta querer resolver, porque tudo isso está rolando por si. Não depende mais de nós, visto que a coisa toda rola por si. O próprio mecanismo fortalece a estrutura que pega tudo.

O: Pega tudo e transforma em combustível para o desassossego.

F: Está consumado, cara; use a palavra que quiser, não adianta. Pode esquecer. O lance é relaxar, deixar rolar... Se rolar, rolou, senão, é isso.

O: Depois que se viu tudo isso, não tem como relaxar.

F: Não resolve ficar pensando em como sair disso; já vimos que não depende mais de nós... Eu por mim mesmo nada posso. Xeque!

O: Eu por mim mesmo, só fortaleço o mim mesmo inquieto.

F: Isso está mais do que claro. O sujeito pode ficar a vida toda nisso, quando, na realidade, não tem mais nada para fazer. Sorte se algo surgir, caso contrário, não dá para ficar pensando nisso não, porque a estrutura pega e usa para seu proveito.

O: Total carência de poder de transcendência. A estrutura pega essa consciência de carência e nos joga numa inquietude descomunal, joga na angústia de querer ter para dar e perceber que não tem, a angústia de querer sentir e não conseguir sentir. Alguns se deprimem quando chegam nesse ponto de tomada de consciência de si mesmo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário