F: Bom dia, Out! Percebo que, em
sua angústia, cada um inventa sua própria oração…
O: Já vimos que a prática da oração
é só mais um dos condicionamentos ilusórios; ela não tem o poder de nos tirar
da bolha emocional que nos mantêm desconectados; e não há nada que nos conecte,
cada um na sua bolha de imaturidade, ilusão e cálculos autocentrados. Visto
isso, o que permanece é só angústia e ansiedade; quando elas não estão aí, fica
o tédio ou solidão.
F: Ou vazio. Nada. Quando o imaginal
da trégua, cai o castelo.
O: Mas logo começa outro; percebo
como ponto básico a desconexão.
F: Se o imaginal ficar entrando,
não tem com sentir, ver, tocar ou ser tocado.
O: E quando o imaginal não está
aí? O imaginal é a própria bolha; está sempre aí, mesmo que de modo sutil. O
imaginal é o fundo da estrutura isolante; nada rompe sua casca, a inquietude
não permite. A própria preocupação para acabar com a inquietude não permite a conexão,
visto que a inquietude impede a totalidade da presença.
F: A própria observação nos
mantém atentos na ilusão. Dificílimo uma observação sem emendar palavras na
sequência. Muito difícil ficar na observação e não esticar o chiclete.
O: A inquietude faz isso.
F: A mente incessante busca por
algo na inquietude.
O: Sim, mesmo que sejam as
palavras, a verbalização compulsiva, que não leva a nada mais que a compreensão
da estrutura, mas sem o poder de transcendência.
F: A palavra parece funcionar
como um combustível. O lance da desconexão é não se tornar combustível do
imaginal; o pensamento continua, só que sem punhetagem da nossa parte.
O: Isso também não resolve.
F: mas é o que temos; percebemos
a desconexão de forma natural, pois ela está em todos. Não adianta mais ficar
alimentando o imaginal.
O: Aqui o imaginal não incomoda
mais... folha ao vento. O que pega é a inquietude, o desassossego. Quando observo
as relações, percebo que o que tem de fato é a desconexão e a simulação de
conexão; todos em seus personagens... se o contato for longo, o personagem se
cansa e o atrito da desconexão se apresenta.
F: Mas quanto mais o imaginal pega
essa desconexão, mais a cristaliza e fica nisso.
O: Faz você sentir a desconexão
com maior intensidade.
F: Isso, não deixa cair. Quando é
mais uma ilusão, porque vivemos o outro lado da coisa e não tem nada disso. Estranho.
Se não ficar atento, o imaginal não deixa passar, mas sem ficar identificado,
querendo manter ou prender as coisas, entender, tudo isso.
O: Mas também não resolve; essa é
só a "droga" atual que estamos usando. Permanece o desassossego, a
inquietude, a desconexão.
F: Não tem o que resolve, só tem
isso. O looping nos joga sempre no desassossego, a inquietude, a desconexão...
O imaginal pega a desconexão, traz a angústia, ou o imaginal pega percebe outra
coisa e nela se apega... Mas é o mesmo movimento que acaba sempre no desassossego,
na inquietude, na desconexão. De novo, de novo e de novo. O sensorial também
muda.
O: Mas a mudança do sensorial é
só na manifestação do desassossego.
F: Então, aqui, novamente, a mente
pega e fica aí, se prende nisso que observa; a própria observação prende e não
solta. A coisa é louca, quando, na realidade, do nada também some. Chega uma
hora em que não adianta mais nada. A mudança do que se passa no sensorial não
depende de nada; é a mente que segura, tentando entender, compreender, sair ou mesmo
ficar; mas nada resolve.
F: Também parte do constante,
ininterrupto e não solicitado fluxo... Sempre a mesma coisa: pensamentos,
sensações diversas, sentimentos... Tudo mesmo fluxo não solicitado. A própria percepção
também está nisso, ela é parte disso.
O: A ignorância parecer ser uma
benção mesmo; quanto mais consciência você alcança sobre a estrutura e sua inquietante
desconexão, mais inquietude e sentimento de desconexão. Se instala um estado de
emergência.
F: E quanto mais conscientes
ficamos, menos relaxados; a consciência disso só gera tensão e a percepção de
que não adianta mais nada. E nisso tudo, de nada adianta querer resolver,
porque tudo isso está rolando por si. Não depende mais de nós, visto que a coisa
toda rola por si. O próprio mecanismo fortalece a estrutura que pega tudo.
O: Pega tudo e transforma em
combustível para o desassossego.
F: Está consumado, cara; use a palavra
que quiser, não adianta. Pode esquecer. O lance é relaxar, deixar rolar... Se
rolar, rolou, senão, é isso.
O: Depois que se viu tudo isso,
não tem como relaxar.
F: Não resolve ficar pensando em
como sair disso; já vimos que não depende mais de nós... Eu por mim mesmo nada
posso. Xeque!
O: Eu por mim mesmo, só fortaleço
o mim mesmo inquieto.
F: Isso está mais do que claro. O
sujeito pode ficar a vida toda nisso, quando, na realidade, não tem mais nada para
fazer. Sorte se algo surgir, caso contrário, não dá para ficar pensando nisso
não, porque a estrutura pega e usa para seu proveito.
O: Total carência de poder de
transcendência. A estrutura pega essa consciência de carência e nos joga numa
inquietude descomunal, joga na angústia de querer ter para dar e perceber que
não tem, a angústia de querer sentir e não conseguir sentir. Alguns se deprimem
quando chegam nesse ponto de tomada de consciência de si mesmo.
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