para a depressão, mas, graças a observação, percebemos a identificação com o impulso depressivo, ser um dos grandes truques da mente para que ela não seja percebida na totalidade de seu mecanismo. O homem, exceto alguns raros, ao longo dos séculos, não conseguiu lidar com a sensação de desamparo, por isso criou uma infinidade de Deus e seus sistemas. A observação passiva não nos dá nada, no entanto, nos arranca toda ilusão observada. Cada ilusão arrancada, sem a possibilidade de se colocar outra em seu lugar, naturalmente só amplia o vazio e a síndrome de abstinência das ilusões. A depressão é um sintoma natural dessa síndrome de retirada das ilusões criadas pela estrutura. Veja, a própria palavra "depressão" já aponta para o que está ocorrendo: a estrutura está sendo pressionada, de um modo que não encontra nada para se agarrar e isso, se mostra terrível para ela, que se vê em estado de agonia. Ela quer algo em que se agarrar, alguém que aponte uma saída, uma resposta. Mas isto aqui vai mostrando a ilusão das doações psicológicas de terceiros, a ilusão de se colecionar incertas certezas emprestadas. A ilusão de se agarrar em promessas.
F: Por isso escrevi que,
provavelmente, por força da angústia e solidão, sugiram as orações, porque o
cara surta não tendo onde se agarrar.
O: Como cantava o poeta etílico,
eu perdi, eu perdi o meu medo da chuva... que criou o Deus da chuva. A
observação arranca os lugares onde você pode pedir algo, arranca todos os afazeres
e prontificações ilusórias, arranca até a ilusão dos questionamentos, visto que
a mente insana, por si mesma, não alcança uma resposta sã. Arranca todo
"somebody to love", porque escancara nossa incapacidade de amar. Não
é fácil encarar a real, por isso sempre brincamos que o paradigma não é para adolescentes,
mas sim, para home e mulher de saco roxo. Cada ilusão arrancada, mais vazio,
mais síndrome. A verdade não oferece consolo para a mente que sempre foi adicta
de consolação. Gandhi costumava dizer que "A verdade é cortante feito
diamante, mas também se mostra tão doce como a flor de pessegueiro". O
paradigma não é para quem ainda se interessa por "mentiras sinceras"
ou para quem ainda quer uma ideologia para viver. Ao contrário disso, o
paradigma vai arrancando toda ideologia, visto que o ideal, não é o real, é só
uma ideia do que se pensa ser o real.
F: Até o cara ver que o próprio
paradigma tem seu limite e também não mais servirá… O cara vai perceber na sua
solidão e sente que não tem nada pra se agarrar.
O: Ainda bem que não serve; o
paradigma é como um programa temporário que se desinstala por si. Elimina os
temporários. Elimina o que é do tempo.
F: Não sei. Mas em determinado
momento, a solidão chega e se instala, aquela que nada resolve, que estava
escondida.
O: Quem mostrou que nada resolve
senão o próprio processo de descondicionamento?
F: Não sei.
O: Se tem olhos de ver, a
resposta é fácil.
F: Não é não. Não é óbvio não; cheio
de truques.
O: Agora é o truque de ser cheio
de truques... Novo discurso a que a mente se apegou.
F: Ok. Beleza!
O: Tudo para ela agora é truque...
O truque de fazer ver o óbvio como truque.
F: Nada.
O: Há quem afirme que são nesses angustiantes
momentos em que nada se mostra com sentido, que se manifesta o exato sentido de
tudo. Mas de nada serve essa doação psicológica de terceiros. Se essa percepção
não ocorrer em nós, continua como tudo mais: um amontoado de palavras.
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