17/02/2021

A impotência diante da narrativa do imaginal sensorial

O: O que vai se tornando cada vez mais nítido é que, fora as atividades que são obrigatórias para a manutenção do corpo, a maior parte da ação é uma fuga da inquietude, por meio da busca de sensação.

F: O fato do indivíduo não pegar a impermanência e a instabilidade do imaginal, após ter conseguido observar sem se identificar, coloca individuo nesse loucura.

O: A rotina produz um embotamento da percepção da realidade.

F: Sim, ela embota.

O: Quando tal embotamento chega ao seu limite, o indivíduo tem aquilo que a sociedade chama de "estresse".

F: Beira do colapso do impossível ajustamento. Perceber que o imaginal e o sensorial não são produzidos por nós, que são passantes e que não se referem a nós, apesar do sensorial ser sentido no corpo, vamos colocar assim, é um grande avanço no processo de descondicionamento. Esse é o ponto que vai ocorrendo aqui.

Só alguém que chegou onde estamos é que se liga na insanidade da busca. Novas roupas, calças, ioga, modismo tribal, grupos, novos trabalhos, novas formas de investimento, novos relacionamentos, novos romances, novas casas, drogas, puts!! Eu não queria ser o que sou! Eu preciso de um pouco de emoção, mais uma emoção, vai, deixe-me esquecer o que sou... para que eu possa procurar por isso... e segue o looping infindável...

O: Bem por aí!

F: Por meia vida fomos adictos do pensamento, do imaginal e do sensorial, fomos devotos do inquestionado sistema de pensamento, crenças e tradições.

O: Não é óbvio para a maioria.

F: Certeza que foi isso que causou a identificação com as sensações, com o corpo. Para mim, faz todo sentido. E quando tivemos as experiências do estado incondicionado de ser, vimos que não é nada disso.

O: Parece que sem uma vivência do absurdo ou do estado incondicionado de ser, os olhos não se abrem para essa qualidade de percepção.

F: O imaginal está enraizado na certeza de que somos um corpo, a mente e as emoções. A experiência do incondicionado estado de ser confirma o contrário. Os pensamentos são o tempo todo usados ​​para sugerir que somos o pensador ou o pensamento sobre o corpo. Pode observar.

O primeiro vício gera todos os outros vícios, o pensador compulsivo. Todos os outros impulsos escapistas eram tentativas de obter alívio do primeiro vício de pensar compulsivamente. O dilema é que o problema é a identificação como imaginal sensorial. Se o imaginal sensorial tenta escapar dele, isso é apenas mais imaginal sensorial. Como diz em AA, o pinguço não pode sair de si. Então, chegamos nesse ponto de perceber que a única maneira de sair do imaginal sensorial é perceber que você não é ele.

O: Sim, você não é nada do que é percebido.

F: O alcoólatra e/ou viciado, perdeu a capacidade de controlar seu consumo de imaginal sensorial e/ou consumo de álcool/droga. Sem saber, o hospedeiro foi tomado por um parasita (alcoolismo). Está sendo usado para obter seu alimento, por isso você falava, “a droga te usou”; no que diz respeito ao fluxo mecânico e não solicitado do imaginal sensorial condicionado, é a mesma coisa: fomos usados durante décadas pelo imaginal e o sensorial. O egocentrismo é a total identificação reativa com o imaginal sensorial condicionado.

O: Muito claro para mim!

F: Está muito claro para mim que não somos o que pensamos e sentimos, apesar disso acontecer em nós.

O: Somos esse estado de ser que está se tornando cada vez mais consciente dessas ocorrências internas não solicitadas.

F: Bem colocado. Não somos nada disso que é passante e, por muitos anos, estivemos identificados com isso, e mesmo isso mudando de segundo a segundo, não conseguíamos perceber isso.

O: Essa oscilação agora é percebida de imediato em sua instalação, por isso não é mais levada a sério em suas imperiosas sugestões.

F: Sim, elas são percebidas de imediato, no momento de sua manifestação.

O: Você as percebe como uma espécie de delírio, mas não se deixa mais ser levado por ele.

F: Delírio total. Perceber isso traz um centramento, um grande alívio, o qual nunca ocorreu antes da instalação da observação passiva não reativa. Pode ver, acordamos todos os dias e o delírio ainda está aí. Só que agora ele é visto de imediato, percebido como projeções do irreal. É percebido como uma mecânica narrativa insana, a qual nada tem a ver conosco, nem com o que é de fato.

O: Trata-se de uma narrativa no palco do tempo psicológico. Está sempre no passado ou no futuro, nunca na percepção do que ocorre no agora.

F: A ação para algo além disso, pode surgir da compreensão disso que estamos vendo e sentindo agora. A percepção do looping da dramaturgia autocentrada, sempre se autorreferenciando. Mesmo quando é deus, os outros, e demais situações, é ainda a mesma coisa autocentrada... futebol ou iluminação, política ou religião... Tudo a mesma coisa... bom ou ruim, certo ou errado... A estrutura condicionada roubou nossa identidade, como no filme “A Origem”... A ilusória identificação com o conteúdo não solicitado do imaginal sensorial, é pior que um vírus, bem mais profundo que uma ideia central.

O: Sim, é muito difícil de quebrar a cristalizada identificação de nós mesmos, como sendo o corpo inquieto e o confuso conteúdo mental.

F: Sinto que estamos perto de um consciente colapso da estrutura psíquica pela qual funcionamos até aqui. Sinto isso com muita intensidade, mas nada disso é sentido com peso, nada disso é fruto do pensamento.

O: Trata-se de uma percepção visceral, digamos assim.

F: Já existe em nós, a capacidade de ver através dos condicionamentos da estrutura. Pode notar:

os ranços, as impressões, as ideias, as imagens que existem sobre tudo, aquela velha opinião formada sobre tudo, como dizia o Raul, elas continuam aí; mas, já é possível ver a sua tentativa de influência, ver que por exemplo, diante de outra pessoa, você a vê, assim como as imagens entrando, o quanto isso dificulta a relação, polui; mas você também vê que a relação não mais é levada para essa completa ilusão, pois ficamos mais calados, sem esforço, apenas observando o desenrolar das situações. Vemos através das imagens, isso ainda é assim no momento, ainda não quebrou, ainda é o que temos.

O: Você não pode se recuperar de uma doença, enquanto não percebe os sintomas de sua manifestação. Estamos identificando os sintomas dessa compartilhada doença mental e emocional, conhecendo seu mecanismo de instalação, desenvolvimento, cristalização, crise de identificação, processo de descondicionamento e seus sintomas de retirada. Só que ainda não sabemos o que é estar — e se isso é possível — totalmente descondicionado, ou seja, significativamente mutacionado psiquicamente. Estamos tomando consciência de toda somatização que a identificação ilusória produz, assim como os sintomas da retirada dessa ilusória identificação.

F: Sim, ainda não estamos livres. Isso é um fato. No entanto, agora sabemos o que temos, muito claramente e que estamos fundo no processo, sem saber onde tudo isso vai dar.

O: Sim, trata-se de um caminho sem bússola, onde antigos conceitos, por mais belos que pareçam ser, de nada servem para nós. Só o que conta é a observação do agora. Tudo que já foi colocado no papel, não tem mais serventia aqui. O que foi colocado no papel, não foi capaz de criar uma nova humanidade.

F: Exato.

O: Certes emprestadas, nunca produziram genuína liberdade, genuína conexão.

F: Nem vou ainda em direção a esse ponto de uma nova humanidade, não entro nisso; a mente aqui não vai em direção disso, mas faz sentido.

O: Então fique com isso: nada disso que já foi postulado, foi capaz de apresentar em si mesmo, uma nova e significativa qualidade de humanidade. Todas as regrinhas psicológicas, todas as equações e sistemas, não apresentaram a livre expressão do ser humano, isso é muito claro, basta observar com seriedade. Observar todos os postulados que apontam uma sequência para uma possível morte psicológica, nunca produziu libertação real. Parece-me que vivemos uma nova visão sobre a negação, cujo embasamento está na negação da identificação com todo conteúdo psicológico do passado, seja ele pessoal ou interpessoal.

F: Mas, apesar disso, ainda vejo a impotência perante tudo isso, perante o próprio funcionamento do fluxo do imaginal e do sensorial, suas projeções, sensações impulsos reativos... Tudo ocorre de modo automático, sem qualquer escolha de nossa parte. Isso é o que vejo aqui.

O: A impotência diante do funcionamento de tudo isso, como em qualquer outra adicção, é o nosso primeiro passo.

F: Sim. Somos tão impotentes ao fluxo, quanto ao batimento do coração.

O: Não controlamos isso.

F: Então, só vejo como real, o passo da impotência perante o funcionamento do mecanismo.

O: Mas há um passo importante aí: a instalação do poder de identificar tudo isso, sem qualquer identificação reativa. Isso me parece ser um poder superior.

F: Muitos não têm isso. Estou apenas constatando, sem qualquer desmerecer.

O: A imediata identificação da projeção de imagens e sensações, bem como dos impulsos de fuga sugeridos por elas, ao menos para mim, tem se mostrado como uma força superior à antiga, neurótica e adulterante identificação. Quem não chega nisso, sempre recai em fugas passadas, fugas essas que nos colocam sempre no início do mesmo looping. Se não pegar isso, a estrutura continua adulterando a própria realidade, bem como a realidade dos menos avisados que entram em contato com ela.

Chegamos num momento em que percebemos que toda ação passada, não descontruiu a estrutura psíquica condicionada, apenas a condicionou de outro modo, tornando-a socialmente ajustada, o que não representa sanidade real.

Não leve a sério o fluxo do imaginal sensorial

O: Bom dia! O lema do momento é: Isso também passará. Só por agora, evite a primeira identificação emotiva reativa escapista, visto que você não conhece a verdade em sua totalidade. Os flashes do imaginal e do sensorial não contêm a verdade que liberta. Vivemos por anos movidos por uma consciência condicionada, a qual, em última análise, é o mesmo que inconsciência. Somente quando passamos a ter consciência da qualidade do conteúdo de nossa consciência, é que passamos a recuperar a consciência real.

B: Voltar a um estado de nada é morrer diariamente, para qualquer conceitualização que nasça. Muito louco perceber isso. Ocorreram algumas compressões ontem, mas também percebi várias tentativas de escapar por meio dessas compreensões.

O: O intelecto não liberta e a verdade não é o que o imaginal projeta; o imaginal não é o que é.

B: Mas, na análise do filme “No limite do amanhã”, não seria o intelecto? Eu percebi essa identificação forte. Tipo emoção mesmo com esse olhar para o filme.

O: O filme, ao contrário, mostra a limitação do intelecto, da lógica e da razão, eles não têm o poder de produzir a assertiva e integrativa ação libertária.

B: Sim. Total. Percebi aqui uma teorização muito forte, tipo recaída mesmo.

O: Só a totalidade da verdade traz sua ação que liberta; meias verdades não libertam. O fato é que ainda observamos em partes, de modo fragmentado. Sem um insight integrativo, permanecemos no mesmo looping de percepção de ontem.

F: O processo aqui se afunila num ponto muito interessante. Pelo menos é o que me vem aqui do momento que estamos, onde os pensamentos e emoções se mostram mutantes. Como disse, é fácil perceber que você não é o pensador ou o sensor, que não é você que produz o fluxo mecânico das imagens, memórias, projeções que se contradizem de momento em momento. Mais difícil é perceber que eles são para ninguém, que rodam, rodam, rodam e se não houver identificação com os mesmos, eles evaporam, mudam, dando lugar a outros. Mais sútil e difícil é a percepção disso. Nesse modo de viver fundamentado no ego, na posse, nas conquistas, nas disputas e vaidades, isso não se torna óbvio.

O: Sem um profundo choque psíquico, não há como.

F: Passamos pela quebra da identificação ilusória com o conteúdo do imaginal e agora, estamos vivendo a instalação do colapso que nos desidentifica do conteúdo não solicitado do sensorial. Foram quarenta anos indo para o norte, quarenta anos indo pela mesma rua que nunca deu em nada, nada, nada, nada, nada, do que eu pensava encontrar. Nada trouxe liberdade, felicidade, amor, empatia real, comunhão. Nada!

O: Bem por aí! Fomos sérios em nossa busca, mas tudo, pelo menos para nós, não se mostrou realmente funcional; meras trocas de condicionamentos e dependências.

F: Está ocorrendo com a percepção do sensorial, o mesmo processo que ocorreu com o imaginal, pelo menos aqui, tem se mostrado idêntico: tudo passante, mutável, controverso, impermanente, sem sentido real. Seu fluxo continua, parece não ter fim, mas não estamos nos identificando de forma reativa e escapista. Tanto o imaginal como o sensorial não é produzido por nós de modo consciente. Só um choque ali, só uma nova ocorrência para dar um stop ali. Só que são quarenta anos na mesma rua, no mesmo deserto.

O: Sim, algo como outro colapso que abale de vez a estrutura, só que agora, no que diz respeito ao sensorial.

F: Isso. Bem provável... Ou na totalidade do mecanismo da estrutura.

O: A identificação com o conteúdo do imaginal já colapsou, apesar de seu fluxo continuar.

F: Já, ele não significa mais nada. Mas pode ter outro ali e zerar, aquietar.

O: Não descartamos essa possibilidade, porque o sensorial é uma resultante do imaginal, é continuidade de um só circuito. Antes estávamos presos nos dois polos desse circuito.

F: Aqui! É bem isso!

O: Antes a energia vital escorria pelos dois polos, tanto pelo imaginal como pelo sensorial reativo.

F: Bingo! Isso é fato!

O: Agora escorre do sensorial.

F: Tanto que é o imaginal que sustenta o sensorial, e quando tem um sensorial sem nada, como nós chamamos de oco, o imaginal entra jogando mais coisas para manter a identificação com o sensorial. Pode perceber isso aí! Tenho percebido isso aqui já há alguns dias.

O: Sim. No oco, entra o imaginal buscando uma forma de ação que produza uma sensação diferente do oco, algo que pareça ter real sentido. Vejo isso ocorrendo aqui... Por exemplo, tenho tempo ocioso e a mente fica cobrando a descoberta de uma atividade que possa ser útil para a sociedade e financeiramente rentável. Percebo o condicionamento de ter que manter uma rotina que ocupe boa parte do dia.

F: Sim.

O: Mas penso que a sociedade não precisa de mais um ser fugindo de si mesmo por meio de uma rotina condicionada pela estrutura social. Penso que ela precisa de alguém com uma nova maneira de perceber a realidade, alguém que saiba se é possível ou não, o resgate de um estado incondicionado de ser, se é possível ou não, viver sem estar preso a uma rotina pré-estabelecida, esperando por descanso depois de quarenta anos nessa rotina.

F: Faz sentido.

O: Veja que o isolamento forçoso da pandemia, deixou claro como o ser humano não consegue viver consigo mesmo, muito menos manter muita intimidade com seus próximos, e que cria rotinas que amenizam a intimidade conflituosa consigo e com os demais, como a ausência do amor está presente ali. Para a maioria, parece que estar na inação é uma ação que dispara o oco e a ausência de sentido, faz explodir a solidão, a incapacidade de amor e comunhão, bem como a insuficiência psíquica. Na inação, o oco explode e exige sensação.

F: Fortíssimo. O estabelecimento de uma rotina é o estabelecido como certo. Sem a rotina, para maioria explode a solidão, o vazio, a ansiedade. Mas penso que esse ainda não é o ponto.

O: Qual seria ao seu ver?

F: Estamos vendo como é possível isso chegar em nós primeiro, mesmo ainda com tudo que fizemos, também sentimos os mesmos sentimentos, solidão e tal, só que a desidentificação em nós, já é uma realidade. Então, ao percebermos tudo isso, o sofrimento não se instala e a coisa se mostra dinâmica.

O: Qualquer ação que não seja proveniente de um insight libertário, para mim, é só mais uma fuga de si mesmo, ou seja, da identificação com o conteúdo do imaginal sensorial condicionado. Qualquer ação que não seja de um insight libertário, não produz a ação assertiva, o modo correto de viver neste mundo. A ação fora de um insight libertário, nos mantém na engrenagem condicionada.

F: Você percebe que há um fator aí que vai contra tudo que está estabelecido?

O: Observe aí o condicionamento de ter que estar em ação, de ter que estar adaptado ao padrão de rotina de trabalho, de segunda a sexta, por oito horas no mínimo, com direito ao sábado e domingo, mas com atividades de lazer. Tem que estar em atividade; tem que estar em busca de agitação e sensação.

F: Claro que percebo. Esse condicionamento é forte; talvez o mais forte em todos. Não há saída, a não ser dar o pulo do gato para cair fora da engrenagem sistêmica. Mesmo assim, há a sensação interna. É disso que estamos falando, certo? Isso é bem mais sutil, essa comichão de ansiedade, essa inquietude crônica que pede por qualquer ação. Fomos criados assim, nesse galinheiro.

O: Sem ação e sensação, o indivíduo cai na ansiedade, em algum tipo de compulsão ou na depressão.

F: Sem a observação passiva não reativa, ele não aguenta o tranco. Vejo que a impermanência do conteúdo do imaginal e do sensorial, de tudo que se passa em nós, é uma realidade. Já não é necessário levar nada disso a sério.

O: Sim, é isso!

16/02/2021

O Platô de Indiferença e o Estado de Não Saber

Sem derrame de lucidez é só platô de indiferença

As bênçãos da inquietude do Platô da Indiferença

F: Queria colocar algo mais sobre isso que chamamos de Platô de Indiferença...Para ser sincero, vejo muitas bênçãos por trás dessa sentida e consciente inquietude do platô...

O: Aprofunde!

F: Veja, ela nos tirou dos grupos anônimos, dos sistemas de crença organizada, arrancou padre, pastor, psicólogo, ioga, retirou praticamente do serviço, da busca de ideais, da luta por poder, prestígio, imagem de sucesso, o querer ser o primeiro no pódio...

O: Sim!

F: Tirou busca, o sentimentalismo barato, a identificação completa com a estrutura psicológica, a autopiedade.

O: Sim, arrancou toda possibilidade dos imaturos mimimis, da compulsão pelo desabafo, pela busca de doações psicológicas de terceiros. Isso é um fato!

F: Foram anos e anos, vivendo no mesmo looping de emoções doentias. Tem muita coisa boa nessa inquietude do Platô da Indiferença.

O: Não discordo.

F: Tirou necessidade de gente ao redor, tirou a insanidade da oração, da reza frenética, tirou o Deus da minha própria compreensão confusa, tirou as regras nas quais fui criado... limpou bastante o Drive.

O: Sim, arrancou aquele impulso neurótico de ter que ter sempre a última palavra em tudo, de ter que criar polêmicas, de ter que se mostrar o Google da sabedoria.

F: Temos uma estrutura complexa... pegue como padrão, por exemplo, um cidadão como Krishnamurti...

O: Que tem ele?

F: Aí fica difícil, não é mesmo?

O: Depende... Antes da retomada do estado incondicionado, ele era um cara pra lá de complexado, nada diferente da compartilhada estrutura psíquica.

F: Tirou a necessidade de muitas sensações que eram como que obrigatórias ao viver. A inquietude do Platô da Indiferença, está nos arrancando de dentro do ovo, cuja casca é feita dos condicionamentos do mundo. Saca, aquela imagem?

O: Sim, aquela imagem de Salvador Dali.

F: Imagem pesada, forte; note que a casca é o mundo... Eu estava meditando aqui... Por que não olhamos ao nosso redor com o mesmo olhar de quem assiste um filme novo? Saca? Percebe?

O: Já disse que nosso olhar está condicionado, que segue um padrão. E não tem como mudar esse padrão, despir-se desse condicionamento, por puro esforço

F: Sim, pelo esforço não tem como. Mas, quando vemos um filme, pelo menos nossa total atenção em alguns momentos fica ali.

O: Não sei você, mas mesmo num filme, hoje, já vou com aquele sentimento de que vou encontrar apenas mais do mesmo.

F: Sim, também tem isso.

O: Penso que o que vivemos hoje, essa capacidade de ficar com a inquietude sem se entregar para nenhum tipo de impulso emotivo reativo escapista, é algo muito semelhante mesmo às obras de Salvador Dali... Parece algo surreal.

F: Sim, hoje temos a capacidade de ficar com a sensação que se apresenta, pegando suas nuances mais sutis, sentindo de modo integral...

O: A casca da estrutura condicionada está rompendo de dentro para fora, sem esforço, sem churumelas, sem lenga-lenga. Quando imaginamos que isso seria possível? Quando imaginamos que alcançaríamos esse poder? Realmente, isso é uma grande benção.

F: Exato! A mutação psíquica já está ocorrendo... Você também sabe!