30/03/2021
26/03/2021
25/03/2021
24/03/2021
A necessidade de uma explosão de maturidade
B: Eu não tenho essa vivência de
vocês, no que diz respeito a dissecação da estrutura condicionada. Nesses
áudios que mando e nas mensagens que trocamos, pode até ser que você perceba
bem a ação dessa estrutura calculista. Eu realmente percebo que muita coisa
ainda me passa batido. Estou observando, vendo por mim mesmo o que acontece em
meus pensamentos, emoções e sensações, mas tem coisa que falta palavra para
descrever ou sei lá, até um déficit de síntese sobre toda essa percepção. Mas
lembro de uma conversa nossa, sobre essa inteligência que nos acorda todos os
dias, que mantém nossos órgãos nessa harmonia. Essa percepção de não esforço e
da vida acontecendo. Por vezes me
confundo se isso vem do cálculo ou se vem daquele inenarrável estado de lucidez
e integridade que já experimentei.
O: Desconhecemos as nossas atuais
circunstâncias fora dos motivos pelas quais foram criadas, portanto, não
sabemos do seu real potencial de ser. Também já sabemos que as mesmas foram
geradas pelos condicionamentos, pelo cálculo, pelo medo e pela degeneração de
nossos instintos naturais. Com uma mente moldada e adulterada pelo sistema, que
em si mesmo é cálculo, não havia, assim como não há, a mínima possibilidade de
ações plenamente conscientes, embasadas na integridade da percepção da
realidade. Você pode perceber nitidamente, que mesmo tendo obtido um nível
maior de percepção, o qual ainda é parcial, fragmentado, ainda estamos sobre os
domínios da estrutura que é confusa, insegura e reativa. Nos grupos anônimos há
um lema que diz: "Insanidade é fazer as mesmas coisas esperando por
resultados diferentes". Não há como, enquanto na estrutura,
parcialmente esclarecida, não criar situações que em seu devido tempo, não
apresentem novos conflitos, limitações e falsas dependências. Enquanto estamos
funcionando dentro da estrutura, a qual é um resultado direto dos herdados e
forçosos condicionamentos sociais, não temos como nos livrar de nossos
maneirismos, das mais variadas e já percebidas formas de vazia vaidade. Como
essa estrutura não tem autonomia psíquica, ela vive preocupada com a aceitação
social, em se adequar ao que é tido por politicamente correto e funcional.
Nesse tipo de reação comportamental, não temos como saber o que é o real
significado das palavras originalidade e liberdade. Não temos como saber o que
é a genuína criatividade, pois sempre, por meio do cálculo e da comparação,
tendemos a nos ajustar ao que já se encontra estabelecido como padrão de ação,
permanecendo como seres de segunda mão.
Parece-me que sem a “recuperação”
dessa lucidez que proporciona a autonomia psíquica, a inquietude permanece e,
por meio dela, o looping da busca de situações pelas quais tentamos aplacar a
inquietude, atividades que de início nos entregamos com euforia mas que, muito
rapidamente, acabam se mostrando vazias e destituídas de real sentido. Então,
inevitavelmente, caímos no looping de querer saber qual é o real sentido da
existência, o que é o viver correto.
As atividades vão se mostrando
muito banais, superficiais, moldadas pela compartilhada estrutura. Fica uma
necessidade de se descobrir algo que realmente nos toque e, quem sabe, aos
demais, uma vez que tudo na vida está em relação. Você percebe que tudo que a
mente condicionada lhe sugere, tem como finalidade a retroalimentação da
compartilhada estrutura, que já é percebida em seu vazio de sentido. Ao
perceber isso, a mente se vê encurralada, sem conhecimento de uma ação pela
qual faça sentido se movimentar. Se você decide sair da inquietude por meio de
alguma atividade que já foi percebida como sem sentido, então, a mente entra
dizendo que, ao fazer aquilo que ela mesma lhe sugeriu, você está
"normotizando". O observador parece se ver entre a cruz e a espada.
F: Uma goma.
O: Nisso, a única opção que
parece ser viável, é permanecer silenciosamente observando o processo de agonia
interna da estrutura, em sua ânsia de sentido, comunhão, integração e liberdade;
observando também a oscilação contraditória, bem como a impermanência dos pensamentos,
emoções, sensações e sentimentos, oscilação essa que nos deixa esclarecidos
quanto a ausência de realidade nos mesmos, bem como a ausência de lucidez. Reagir
a essa oscilação só produz mais lenha para a fogueira da oscilação da estrutura
condicionada.
F: Só mais emoção.
O: Só cabe mesmo assistir os
filminhos, os monólogos da estrutura.
F: Isso é o que dá para fazer:
assistir o desmanche, a agonia da estrutura em processo de morte assistida.
O: Nesse assistir a agonia da
estrutura em processo de morte, instala-se também um sentimento de tristeza,
uma forma de luto, o qual também é observado e sentido sem identificação
reativa ou escapista.
C: Exatamente...
O: Você percebe que não faz
sentido algum continuar nas circunstâncias presentes, por meio do impulso
passado que as estruturaram, portanto, se instala uma necessidade de encontrar
uma nova maneira de se relacionar com tudo que é. Mas a estrutura só conhece um
modo de funcionar já estruturado e, ao perceber isso, ela tenta entrar com
jorros de ansiedade e desespero, o que também é observado de modo passivo e não
reativo. Tudo isso, ao ser observado de modo passivo e não reativo, parece-me
que vai enfraquecendo cada vez mais o poder de enredamento da estrutura.
F: Fica claro que só uma mudança
no modo de ver. Não é algo novo externo que necessitamos; mas de algo que mude
o nosso modo de percepcionar tudo. Eu não sinto tanta tristeza aqui como antes,
mas sinto uma inquietude descomunal. Há energia, mas acabamos ficando com o que
sente, isso que ocorre, sem buscar pelo vício do desabafo.
O: Se você observar bem, verá que
já ocorreu uma significativa mutação, ainda que parcial, tanto na nossa
capacidade de percepção, como na capacidade de sentir e não fugir do que se
sente. Quanto mais você se aprofunda na observação passiva não reativa, mais instantaneamente
pega a tentativa de enredamento dos filmes e monólogos da estrutura.
F: Se entrar no filme, já era! Acaba
vivendi na abstração, na ficção, na dramaturgia criada pela estrutura.
O: A estrutura se fortalece pela
identificação inconsciente com seus enredos não solicitados.
F: Sim. Mas é uma inquietude absurda,
que enche o saco. Infelizmente, até aqui, é só isso que há.
O: Por isso que ela se agita cada
vez mais, quando percebe que está sendo percebida, que não está conseguindo nem
controlar o comportamento, nem uma ideia libertária.
F: Esse é um momento muito louco do
processo porque, antes, não havia a observação e a identificado era constante, tudo
que surgia nos filmes da mente e das emoções, era visto como algo real.
O: A observação passiva e não
reativa está arrancando o poder de controle da estrutura sobre nós.
F: Antes estávamos identificados,
colados como sendo esses filmes do imaginal sensorial condicionado. Agora o
conteúdo vem, fica um curto espaço de tempo, tipo um comercial, e some por si
mesmo.
O: A compartilhada estrutura
condicionada fez de nós seres imaturos. Precisamos de algo do tipo, "uma
explosão de maturidade".
F: Cai em algo parecido com o que
apontava o Segundo Passo das escolas de anônimos, mas nas devidas proporções, é
claro.
O: ...“Viemos a acreditar que
um poder superior a nós mesmos poderia devolver-nos à sanidade”... Mas
aqui, esse poder superior nada tem a ver com os preconceitos a respeito de um
Deus criado ou aceito em meio de profunda confusão. A sanidade é o estado de lúcida
e integrativa autonomia psíquica.
F: Nem me lembrava corretamente da
frase. Isso, sem o preconceito de Deus. Percebe-se que agora estamos nisso.
Isso está muito óbvio. Caracas! Meu pai!... Até estourou os miolos aqui.
O: Essa admissão veio precedida
da admissão de que somos impotentes perante a mecanicidade não solicitada do
fluxo do imaginal sensorial condicionado, que pela antiga identificação com tal
fluxo, adulteramos a nossa realidade, bem como a realidade de todos que tocamos
de modo inconsciente e inconsequente. Há também a percepção de que não há como
deixar de adulterar a própria realidade, bem como a de terceiros, se a
condicionada estrutura permanecer.
C: A estrutura condicionada é como
uma areia movediça: quanto mais você se mexe, mais se identifica e mais nela afunda.
O: Por isso digo que estamos
vivendo um processo consciente de "fundo de poço da estrutura"...
Estamos como que assistindo e sentindo até onde ela pode chegar com suas
projeções e impulsos emotivos reativos escapistas e separatistas. Tudo isso, feito
de modo silencioso, passivo e não reativo, visto que foi percebido que a
verbalização, o desabafo, é só mais um dos jogos da estrutura, jogo esse que,
numa observação mais profunda, só a alimenta.
F: A verbalização movimenta a
estrutura; a língua está ligada nela.
O: A estrutura criou o
condicionamento de que, pelo desabafo, pela confissão, pela verbalização, a
estrutura pode mudar. No entanto, o que se percebe é que ela só faz trocar as
vestimentas, os enredos criados pela própria estrutura. Por isso que digo
sempre que "bafo de boca não cozinha ovo". Mas é também preciso
perceber que ela também criou o condicionamento oposto: o voto de contrição, de
silêncio forçoso como forma de vir-a-ser algo diferente do que ela é.
Percebe-se os dois lados do condicionamento da mesma estrutura.
C: A estrutura condicionada cria
argumentos para se manter.
O: Mas, entre as duas formas de
condicionamento, parece-me que o silêncio é menos condicionante, visto que na
verbalização, quase sempre ocorre uma forma de doação psicológica de terceiros,
a qual, em última análise, é um fator de condicionamento.
F: Aqui é visto o mesmo. Mas o
próprio silêncio, se for usado como a verbalização, acaba dando na mesma. A diferença
que vejo, é que verbalizar via desabafo, causa uma identificação instantânea; o
silêncio também pode criar a mesma identificação.
A necessidade de um poder de percepção superior
O: Sem uma percepção além da
estrutura, permanecemos na estrutura e nas circunstâncias por ela estruturada.
F: Está tudo dominado pela
estrutura e não tem sequer o que fazer.
O: Não conseguimos ver as
circunstâncias de maneira nova, totalmente depurada da afetação adulterante do
cálculo autocentrado, livre da dependência criada pelo medo do desamparo, da
solidão e do ostracismo.
F: Sim, não vemos; é igual
aquelas melecas... Por mais que você estica, a coisa permanece grudada. Pela
mente condicionada, não há o que fazer, mesmo que não tenha medo. Nem medo
sinto mais, já não sinto mais nada, zero.
O: Não creio que isso seja verdadeiro.
F: Não há a mínima possibilidade
de sair disso.
F: Não sinto medo, mesmo que ele
venha, com a observação passiva, ele some, passa. O medo já não tem o mesmo
poder de antes, já não domina mais. Ele permanece em looping, se apresentando e
morrendo com a observação.
O: Mas ele ainda está aí.
F: Agora não, não tem nada aqui,
a não ser a sensação de saco cheio.
O: Se está de saco cheio, o que lhe
impede de esvaziá-lo?
F: Está bem Out... Beleza que é
assim... Aperta botão e pronto! Aqui não é assim não. Sorry! As coisas aqui
ficam um tempinho. Borá sorrir na frente das câmeras, que bosta!
O: O que te impede de largar isso,
ou de ver suas atuais circunstâncias de maneira nova?
F: Já vejo de outra maneira.
O: Tudo que é produto do cálculo
autocentrado, não tem amor e, sem amor, só pode gerar conflito. Enquanto
funcionamos no cálculo autocentrado, não há bem-estar, somente ajustamento, forçoso
comportamento politicamente correto, o desgastante cumprir de protocolos;
permanecemos no looping das circunstâncias sem amor.
F: Já não sou o politicamente
correto, mas não tem por onde correr, permanece a velha inquietude. Pode morrer
mesmo que acabou; só se ocorrer um “milagre”.
O: Sem uma percepção além da
estrutura, permanecemos na estrutura e nas circunstâncias por ela estruturada,
se relacionando com elas do mesmo modo estruturado.
F: Exato! Ainda bem que a vida
trouxe uns caras como vocês para dar uns toques na coisa.
O: Talvez nem sejam as
circunstâncias... Mas a necessidade de descobrir um novo olhar que não seja
cálculo, ajustamento ou responsabilidade forçada.
F: Para mim, está mais do que
claro que não são as circunstâncias.
O: Enquanto na estrutura, você
pode até abandonar suas atuais circunstâncias, mas, inevitavelmente,
estruturará circunstâncias igualmente vazias de real comunhão e sentido.
Percebo que dentro da estrutura, não tem para onde correr.
F: Trata-se de uma só coisa. O
que impressiona é que, mesmo com a observação, ela atraca numa coisa e fica,
seja qual for a bola da vez. É sempre a mesma forma de funcionamento, apenas
com roupagem distinta.
A: Exatamente, permanece na obsessão da vez. A inquietude é
medo.
O: Falta-nos a integridade da
lucidez não emotiva. Carecemos disso.
F: Sei lá! Independente do nome, não
tenho.
O: Tudo que fazemos está
adulterado pelo cálculo, pela emoção reativa ou pela carga do passado, pela experiência
do conhecido.
A: É o medo que nos impede de esvaziarmos
o saco. O medo anda de mãos dadas com todas as outras emoções, que foram nomeadas,
mas é uma só coisa.
F: Não esvazia porque o esvaziar é
também um produto do cálculo autocentrado. Percebe? A estrutura parece não ter
fim.
O: Mas estaria a resposta
libertária na ação emotiva de esvaziamento do saco? Logo ali, a estrutura
começa a estruturar novas circunstâncias que novamente trarão o mesmo conteúdo
que cria o sentimento de estar de saco cheio.
F: Estamos mais do que
conscientes de que não tem sentido sentir medo, mesmo assim, sentimos. Qual o sentido
viver diariamente afetado por loopings de medo? E vivemos! Não há sentido, a estrutura
calculista roda por si.
A: Sim, e o cálculo é medo em
ação. Não faz sentido nenhum viver seno afetado pelo medo.
O: Nosso saco está cheio é do
próprio olhar condicionado da estrutura.
F: Exato! Mesmo a mente vendo
isso, ela não esvazia. Ela viu isso, está vendo agora mesmo.
A: O próprio cálculo da mente não
é suficiente para esvaziá-la.
O: O que é preciso esvaziar, a
meu ver, é o olhar da mente estruturada. Uma mente estruturada no cálculo,
nunca saberá o que é comunhão real, nunca estará livre do processo adulterante
do cálculo autocentrado. Uma mente sem real comunhão, como pode saber o que é
bem-estar? Veja, não temos real comunhão com nada e com ninguém.
A: A estrutura tem que sofrer um
impeachment.
O: Isso, algo assim, algo que não
seja um produto dos seus cálculos.
F: Boa! Verdade! Isso faz total
sentido!
O: Estamos presos num looping de
cálculos autocentrados que impedem a real comunhão.
F: Somos insensíveis, pela compreensão
conseguimos ver que o outro também tem isso, mas a reação emocional sempre nos joga
para o lado do auto-interesse, para o cálculo autocentrado.
A: Tudo o que é causado pela
estrutura condicionada é sempre limitado, fragmentado, destituído de real
sentido.
O: Enquanto permanecemos nesse
looping, não há como saber o que é autonomia psíquica, liberdade, sentido real
de viver.
F: A sensibilidade da estrutura é
forçada, calculada. Estamos fudidos! Pela estrutura condicionada, não vejo
saída. Só não chuto o pau da barraca diante das minhas atuais circunstâncias,
porque percebo que isso é só mais um dos impulsos emotivos reativos escapistas
e separatistas da própria estrutura; é só mais um looping dela: largar relação,
sair do emprego, mudar de cidade ou de país, etc., etc., etc.
A: Não tem ação libertária e
integrativa por meio da estrutura.
O: Todos que funcionam dentro da
mesma estrutura, alimentam o impulso calculista e separatista... riscou o
cálculo autocentrado, ostracismo, cristalização da imagem previamente formada
das pessoas e situações.
A: Fato!
F: A estrutura é única! Isso é
fato mas, mesmo percebendo isso, ela permanece criando novas formas de looping,
criando outra imagem para tentar sair da imagem. É como no filme “A Origem”... Não tem saída! Já nem sabemos mais o que é sonho,
se é dentro do sonho ou de um sonho dentro de outro sonho. Ferrou tudo!
O: A meu ver, sem a ocorrência de
uma percepção libertária, integrada, não pontualizada, livre da emoção reativa,
não saberemos o que é o viver correto, o que é comunhão, liberdade, felicidade,
amor, vocação, ausência do cálculo autocentrado, permanecemos no looping.
F: Pode ser isso. Já nem sei!
O: A expressão "não
sei", demonstra a ausência da percepção que integra à realidade.
F: Mas é real. Eu já não sinto o
medo como antes, já não estou sendo dominado por ele. Não estou sendo hipócrita.
O: Sinto que precisamos de um
contato com algo, em nós, que não faça parte da estrutura calculista.
F: Tem que ocorrer algo além da
estrutura limitada que somos, senão, é isso.
O: Veja bem: algo "em
nós"... não algo vindo do céu, de outra dimensão ou fora disso que somos. Creio
que até aqui, dissecamos muito bem a estrutura e seu funcionamento, ao ponto de
percebermos que, por mais esclarecida que seja essa estrutura, ela não tem
como, por si mesma, superar sua limitação de percepção da realidade. Em vista
disso, é preciso a manifestação de um poder superior de percepção à própria
estrutura; algo que surja de alguma dimensão interna não tocada pelo cálculo,
pelos preconceitos, pelas manias e tendências, pelas falsas dependências.
A: Isso!
F: Se vier do céu, tudo
bem... Não interessa de onde vem. Já tivemos uma breve amostra de que aquele
estado integrado de ser, não se limita nem mesmo ao nosso corpo.